“A dermatite atópica é uma doença que tem tido uma maior visibilidade, nos últimos tempos”, afirmou o especialista em Dermatologia e Venereologia Pedro Mendes Bastos, acrescentando que se trata da doença inflamatória da pele mais frequente, em todo o mundo, apesar de estar, em muitos casos, subdiagnosticada e subtratada.
Numa conversa na web, que teve como ponto de partida os “desafios da dermatite atópica (DA) e outros eczemas, no contexto pandémico”, o médico – também consultor científico da Associação Dermatite Atópica Portugal (ADERMAP) e investigador em ensaios clínicos em doenças dermatológicas imunomediadas – abordou o diagnóstico e a terapêutica de alguns eczemas.
O eczema caracteriza-se por lesões eritematosas, por vezes, com edema, em que se pode observar pápulas e também fenómenos de liquenificação, sendo, geralmente, sintomático, começou por lembrar Pedro Mendes Bastos.
Ainda neste ponto, ressalvou que “o que se observa na pele dos doentes” varia, consoante se esteja perante eczemas agudos, subagudos ou já em fase crónica.
Considerando o vasto espectro de eczemas, o dermatologista centrou a sua apresentação em três: a dermatite seborreica, o eczema asteatótico e a dermatite atópica (DA), sendo todos eles de causa endógena, embora possam ser agravados por fatores externos.
Descrevendo a dermatite seborreica, o especialista lembra que esta é “extremamente prevalente” na população, e que envolve, predominantemente, as áreas seborreicas da pele – couro cabeludo, face e tronco – e que, mais raramente, pode atingir pregas.
Em termos de terapêutica, no caso do couro cabeludo, a utilização de champôs – enquanto produtos não medicamentosos auxiliares do tratamento – pode ser “bastante útil”, existindo vários laboratórios e formulações, contendo piritionato de zinco, sulfeto de selénio, setoconazol, derivados do alcatrão, dlimbazol, piroctona olamina, ácido salicílico e lactato de amónio. Nas situações em que existe “muita irritação”, nesta zona, colocou a opção de uma solução com dermocorticóide e, ou, ácido salicílico.
Na face e tronco, os exemplos apresentados foram hidratantes “oil-free”, dermocosméticos com antifúngicos tópicos e champô como gel de banho, enquanto, nas situações de crise, referiu poder recorrer-se a dermocorticóide – “potência fraca a moderada, ciclos curtos, evitar face” – e a antifúngicos.
Ainda no âmbito da dermatite seborreica, houve tempo para se falar da idade pediátrica, uma vez que esta é “muito típica” nos primeiros três meses de vida.
“Aqui, a mensagem [para os pais] é: calma. É uma situação, normalmente, transitória, não vale a pena ficarmos stressados, normalmente, o bebé está perfeitamente assintomático”, defendeu, sustentando que resulta de uma adaptação ao microbioma novo e que, nesta fase, existe também uma hiperseborreia.
Já a partir dos três meses “o mais provável” é ser uma dermatite atópica, explicou, ressalvando que também se pode identificar quadros mistos.
Passando para uma faixa etária “mais elevada”, referiu que uma forma de eczema muito frequente é o asteatótico, ou caquelé, geralmente, a nível das pernas e dos membros superiores, caracterizada por uma descamação poligonal, “por vezes, com algum eritema”.
Relativamente à terapêutica o dermatologista abordou “medidas gerais”, nas quais se incluem a roupa de algodão, o banho apropriado, bem como emolientes adequados, e, se a inflamação for excessiva, dermocorticóide.
Entrando no campo da DA, o especialista referiu que a “grande maioria” dos doentes tem uma história familiar, de atopia”, explicando que se trata de uma tendência para desenvolver entidades como DA, rinite alérgica, asma e alergia alimentar, apesar de todas serem “fundamentalmente diferentes”.
Neste tipo de eczema – DA – Pedro Mendes Bastos, com base num estudo recente, refere que existe uma disfunção de barreira: “A epiderme e a derme destes doentes não funcionam de uma forma normal, e existem mutações genéticas pontuais, a nível de constituintes e a pele não se consegue defender, adequadamente, do exterior”.
Há, pois, consequências associadas, nomeadamente, a perda de água transepidérmica muito importante, e a entrada na pele de componentes exteriores, que podem desencadear a inflamação, fundamentalmente, da dermo.
“Paralelamente a estas mutações genéticas a nível estrutural da pele, existem algumas mutações genéticas, a nível imunológico, e, portanto, estes doentes têm um perfil do tipo Th2, a nível de inflamação da pele”, salientou.
Frisou ainda que a dermatite atópica, na sua essência, não é uma alergia: “De acordo com o entendimento atual, nós percecionamos a dermatite atópica como a porta de entrada para aquilo que hoje chamamos de marcha atópica”.
Numa mensagem dirigida aos médicos de família e pediatras, o dermatologista fala da terapêutica aconselhada no caso das DA ligeiras.
Partindo do problema de barreira cutânea, aponta como fundamental otimizá-la, através do uso de roupa de algodão, de banho adequado – rápidos e sem produtos agressivos – e a utilização de emolientes adequados (bálsamos > creme > leite).
No caso de lesões de eczema poderá recorrer-se à terapêutica anti-inflamatória, através de dermocorticóides ou inibidores da calcineurina, como é exemplo a tacrolímus pomada.
Apesar de considerar que a doença esteve “alguns anos fora das luzes da ribalta”, ressalvou que se está a assistir, atualmente, a uma “revolução terapêutica na DA”, que permite tratar cada vez mais doentes, sobretudo, nas formas graves.
Nesta conversa da web, foram também abordadas as dermatites de contacto em tempos de Covid-19 e deixadas sugestões para a sua minimização, entre as quais, a colocação de compressas de algodão entre máscara e pele, o reforço da hidratação, em período de repouso e a continuidade das terapêuticas tópicas prévias, para evitar agravamentos.
O especialista deixou ainda a sua opinião sobre a gestão partilhada do doente, entre a dermatologia e a Medicina Geral e Familiar.
“É um gosto trabalhar com os médicos de família, no sentido de gerir o doente”, afirmou, concluindo que “trabalhar em equipa é o segredo da medicina, atualmente, principalmente nas doenças complexas”.
A atual pressão que se coloca nos Cuidados de Saúde Primários (CSP) em Portugal é um presente envenenado para os seus utentes e profissionais de saúde.