A Medicina é uma área em permanente evolução, com avanços tecnológicos constantes e mudanças epidemiológicas (um exemplo paradigmático é a recente pandemia de COVID-19). Por outro lado, também as alterações demográficas, com o crescente envelhecimento da população e as múltiplas patologias que acarreta, representam um novo e permanente desafio. Por essas razões, os especialistas em Medicina Geral e Familiar, à semelhança de outras especialidades médicas, deveriam periodicamente renovar e atualizar os seus conhecimentos. Qualquer processo de certificação em medicina deve ser entendido como um conjunto de patamares que definem o nível mínimo de conhecimentos necessários ao adequado exercício profissional. No que concerne a esta temática, importa trazer novamente à discussão o processo de recertificação, que poderíamos também apelidar de “certificação horizontal”, mecanismo fundamental para evitar que o conhecimento médico evolua apenas aquando da avaliação para progressão de categoria. A recertificação representa, portanto, uma oportunidade para o médico manter o seu padrão de erudição e aperfeiçoamento ao longo da sua vida profissional. Este processo de recertificação em medicina parece ser de extrema importância, uma vez que contribui para garantir que os médicos se mantenham actualizados em relação às últimas práticas, tecnologias e informações médicas disponíveis. É por isso fundamental que tenham acesso à mais recente evidência científica. Este aspecto é crucial para garantir que os doentes recebem um elevado nível de atendimento e segurança. No nosso país não existe ainda um sistema autónomo e objectivo de recertificação dos médicos nem uma entidade formalmente responsável por este processo. No entanto, modelos já existentes em diversos países têm mostrado ser benéficos à profissão médica, estabelecendo e reforçando padrões de excelência nos cuidados prestados. Seria por isso uma mais-valia a implementação deste procedimento. Deste modo, poder-se-ia garantir a manutenção de cuidados que vão de encontro aos padrões de qualidade, tanto no tratamento do indivíduo quanto da sua família, de acordo com os avanços da Medicina Geral e Familiar e as necessidades de saúde da comunidade. A recertificação deve atestar a formação médica contínua e o desenvolvimento profissional contínuo dos médicos de família. Este processo deve ter algumas características: Estar devidamente regulamentado e ser transversal a todos os médicos, nomeadamente os médicos de família. Pelo menos numa fase inicial, ser voluntário e de carácter facultativo, sendo que os médicos que concluíssem o processo poderiam ter reconhecimento público e utilizar os respectivos títulos no seu percurso profissional. Necessidade de ser renovado de forma periódica (com uma frequência a definir). Não ter um carácter punitivo, mas antes estar integrado num programa de melhoria contínua da qualidade. Ser baseado em indicadores previamente definidos, com peso significativo na prática clínica, consensuais e com critérios de qualidade comprovados. Ser de fácil implementação e facilitado pela administração local. Válido em todo o Sistema Nacional de Saúde, o que implica um processo de homologação. A implementação de um processo de recertificação em medicina poderia, em última análise, melhorar a qualidade global dos cuidados prestados aos utentes. Não podemos, no entanto, ignorar que este processo pode também ser encarado como uma fonte de ansiedade e pressão adicional para os médicos, já demasiado sobrecarregados com uma multiplicidade de outras tarefas. É por isso essencial que seja justo e transparente e que as autoridades competentes sejam sensíveis às preocupações dos médicos, facilitando o processo sem comprometer os padrões de qualidade e segurança do atendimento médico. Tal como dizia Steve Jobs, empresário e fundador da Apple®, “não se pode impor a produtividade, mas fornecer as ferramentas para permitir que as pessoas se transformem no seu melhor”.