O relatório “Um Futuro para a Saúde – todos temos um papel a desempenhar”, elaborado por uma comissão peritos nacionais e internacionais, é a resposta ao convite da Plataforma Gulbenkian para um Sistema de Saúde Sustentável de “construir uma nova visão do Sistema Nacional de Saúde (SNS)”.
Esta comissão foi presidida por Nigel Crisp, que liderou o Serviço Nacional de Saúde britânico (NHS) e contou com o contributo de 35 especialistas portugueses.
Apresentado hoje em Lisboa, o relatório propõe uma “mudança radical para melhorar a saúde e criar um sistema de saúde que seja sustentável no futuro” e propõe um novo pacto na saúde, em que todos terão um papel a desempenhar – os cidadãos, os profissionais da saúde, os professores, os empresários, as autarquias e o Governo.
Os peritos defendem “uma transição do sistema actual, centrado no hospital e na doença, em que todas as acções têm como objecto e alvo o doente, para um sistema centrado nas pessoas e baseado na saúde, em que os cidadãos são parceiros na promoção da saúde e na organização dos cuidados”.
Para tutelar este “pacto para a saúde”, a Comissão defende a criação de um Conselho Nacional de Saúde, “representativo dos cidadãos e de todos os sectores da sociedade” e que deverá ser “politicamente independente e responsável perante a Assembleia da República, o ministro da Saúde e a população em geral”.
Outra recomendação passa pela criação de um novo organismo – o SNS Evidência – para “conjugar o programa existente de normas de orientação clínica com novos processos para avaliação das novas tecnologias e terapias, assegurando que o sistema faculta, de forma sempre actualizada e crítica, o melhor conhecimento científico disponível (as evidências científicas)”.
Para “ajudar a suportar os custos de 'redundância' e outros custos provisórios do desenvolvimento de um sistema de saúde, em que haja melhor gestão das doenças crónicas, mais serviços domiciliários nas comunidades locais e redes de especialidades cobrindo todas as regiões do país”, a comissão defende a criação de “um fundo de transição”.
A comissão deixa um repto aos cidadãos e à sociedade em geral: “Os cidadãos terão de estar na posse dos seus registos de saúde, de dispor de informações sobre a qualidade e os custos dos serviços e de participar nos processos de decisão”.
Para essa nova participação dos cidadãos na saúde, os especialistas recomendam uma série de medidas, como “um novo programa intersectorial do governo para a educação e literacia da saúde que prepare, em termos práticos, os cidadãos para se manterem saudáveis e para, quando doentes, participarem na tomada de decisões”.
Os especialistas sugerem que seja “dada elevada prioridade à plena implementação de um registo de saúde electrónico, como base essencial para um serviço integrado de alta qualidade e que faculte aos cidadãos, em formato electrónico ou outro, toda a informação sobre a sua saúde” e “uma fonte única de informação acreditada acessível a todos os cidadãos, eventualmente integrada no Portal da Saúde”.
“O Ministério da Saúde deverá nomear não-profissionais para representar a perspectiva dos cidadãos e dos doentes perante os órgãos de gestão das instituições de saúde”.
Segundo o relatório “o envelhecimento da população e o aumento das patologias crónicas de longa duração exigem que novos serviços sejam criados”. “Serviços domiciliários e de proximidade mais disponíveis, com a participação das instituições de solidariedade e voluntariado, para melhorar a oferta de cuidados de longa duração, de cuidados paliativos e de saúde mental, tirando vantagem dos avanços da medicina e da tecnologia para novas formas de monitorizar parâmetros de saúde, novas formas de diagnóstico e tratamento”.
Outra recomendação vai no sentido da melhoria das “condições para a gestão das doenças crónicas, tendo como alvo 5,5 milhões de pessoas que padecem de uma ou mais patologias crónicas”.
“Este objectivo deve incluir cerca de 4% da população que sofre de cinco ou mais doenças crónicas, reconhecendo que 5% dos doentes com períodos de internamento hospitalar mais longos usam cerca de 31% das camas”.
“A criação de uma rede de referenciação de especialidades, por exemplo nas áreas do cancro e dos acidentes vasculares, para facilitar a articulação de cuidados em grandes centros e regiões, melhorando os seus níveis de prestação e libertando financiamento que pode ser investido em outros serviços” é ideia igualmente defendida pela comissão.
O relatório defende a promoção do “estatuto dos enfermeiros” através da nomeação de um director-geral de enfermagem.
A medida deverá reforçar o papel destes profissionais, tendo em conta que em Portugal “a enfermagem está relativamente subaproveitada nas suas capacidades relativamente ao que ocorre noutros países europeus, pelo que os profissionais de enfermagem poderão desempenhar funções mais amplas e mais proeminentes no futuro”.
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Nos últimos tempos, temos assistido ao êxodo crescente de médicos, em geral, e Especialistas de Medicina Geral e Familiar, em particular, do Serviço Nacional de Saúde, uns por aposentação e outros por optarem por sair da função pública, ou até pela emigração. A rigidez da tutela, o excesso de burocracia, a falta de material e equipamento nas unidades, as carreiras e salários completamente desfasados da realidade, entre outros, são fatores que vão afastando os médicos. Em algumas zonas do país é desolador o cenário de Centros de Saúde sem médicos, unidades com mais de 9 000 utentes, e apenas um médico ao serviço. Dando o exemplo do meu ACeS, numa zona geográfica e socio-económica até agradável, no último concurso de recrutamento médico, de 41 vagas, apenas 7 foram preenchidas! Onde ainda se vai percebendo alguma estabilidade e capacidade de retenção dos profissionais é, efectivamente, nas Unidades de Saúde Familiar modelo B.