[caption id="attachment_11851" align="alignnone" width="300"] Rui Cernadas - Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.[/caption]
O país por vezes acorda e olha-se ao espelho.
E por regra não gosta do que vê!
A Saúde justifica e vende jornais e tempos na comunicação social, apelando muitas vezes àquilo que nem chega a ser informação, ficando-se pelo alarmismo perigoso ou ignorante ou simplesmente bacoco.
Um estudo da Escola Nacional de Saúde Pública de finais de 2014 concluía que mais de 60% da população portuguesa evidenciava um nível de literacia geral em Saúde baixo ou inadequado.
Como de costume, os outros países lá vão à nossa frente e a pior notícia, nem era essa, era a de que aparentemente os cidadãos não se cultivaram mais ao longo dos últimos 20 anos!
Como acontece com todos os estudos… Há os que neles acreditam e os que deles duvidam.
Antes dizia-se que, na ciência, sempre permanecem dúvidas e a vontade de aprender passa por ter de – e saber – colocar as questões…
Como quer que seja, a verdade é que a iliteracia em Saúde tem custos brutais para o país.
A começar pelo comportamento da sociedade relativamente ao hospitalocentrismo que leva as pessoas, por norma e em primeira mão, a recorrerem aos hospitais, quando poderiam recorrer e exigir ser atendidas nas unidades funcionais de cuidados primários e de proximidade.
Ou que nos leva a ignorar, num país em que temos muito mais telemóveis do que gente, o estúpido investimento em linhas telefónicas permanentes, como o “Saúde 24”, desperdiçando aconselhamento e orientação profissional e competente!… Ou a não cumprir as indicações a observar em caso de doença infecciosa, como a gripe, evitando aglomerações e deslocações desnecessárias e em condições que põem em risco, quer os próprios doentes, quer os outros doentes e acompanhantes que se acumulam em salas de espera em hospitais e centros de Saúde. Isto para já não falar nessa óbvia loucura que é toda a gente querer, à força, uma medicalização do sistema de Saúde que, em comunidades em envelhecimento, só agrava os problemas das interacções e complicações farmacológicas…
E nem complicarei falando da falta de informação e de capacitação dos cidadãos para a gestão ou monitorização das suas doenças crónicas, para as quais, por exemplo as farmácias, poderiam em proximidade e acessibilidade garantir um aporte e apoio fundamentais que – mais uma vez – o país desperdiça!
Estas são questões que todos deveríamos analisar e equacionar devidamente com um único objectivo: compreender o que se pode fazer para alterar um cenário que é conhecido e garantir a correcção do que identificamos como errado, introduzindo as alterações que se imponham.
A começar pela estratégia nacional que se impõe em matéria de educação e literacia para a Saúde.
Como é possível continuar a acreditar que o Serviço Nacional de Saúde poderá manter ou assegurar uma resposta adequada, tão ampla e universal quanto elástica e flexível, eticamente irrepreensível e cientificamente acreditada, em situações para as quais jamais algum serviço ou hospital poderá estar preparado?
E como é possível aceitar-se que, ano após ano, nas mais diversas e repetitivas situações se não ganhe força para trabalhar, investir e cumprir um vasto programa de educação para a Saúde, coerente, estruturado e integrado?
Poderá um dia resolver-se o problema das urgências sobrelotadas e com doentes “aos molhos”, em semanas de gripe?
Tem solução o paradoxo que leva a que alguém proteste quando se encerra uma extensão à porta de casa, mas faz quilómetros para ir a um hospital quando acometido de uma cefaleia banal ou de uma contractura lombar, em pleno dia de semana e a meio da tarde?
Claro que não. Não encontraremos qualquer solução razoável e definitiva que dispense passos e medidas que respondam àquelas perguntas…
A questão não passa pela obsessão pela transparência, nem pela demagogia das necessidades dos cidadãos, abordadas de forma avulsa num mero exercício de retórica.
A solução tem de ser estratégica, global e intencional.
Educar para formar cidadãos.
Respeitar as crenças mas ser realista quanto às expectativas.
Elevar a literacia em Saúde sem ignorar que não falamos de escolaridade.
Respeitar os outros, os cidadãos, os utentes e os doentes, começando por nos respeitar e assumir enquanto técnicos e comunicadores.
A atual pressão que se coloca nos Cuidados de Saúde Primários (CSP) em Portugal é um presente envenenado para os seus utentes e profissionais de saúde.