[caption id="attachment_11851" align="alignnone" width="300"] Rui Cernadas - Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.[/caption]
Em momento algum da sua história, o Serviço Nacional de Saúde (SNS) foi capaz de resolver a falta de médicos, especialmente, nos cuidados de saúde primários (CSP).
Vejam-se os SAP ou SASU (entre muitas outras designações utilizadas), criados e mantidos em muitos locais como forma de oferecer algum tipo de assistência aos milhões de contribuintes que então não podiam, mesmo, dispor de médicos de família!
O problema é que a memória é curta e são muitos os que por dá-cá-aquela-palha se apressam a opinar na primeira oportunidade, baralhando, como se todos quantos os rodeiam andassem distraídos.
Por exemplo, em zonas nas quais a garantia de médico de família está assegurada, como acontece, entre outros, em ACES totalmente reconfigurados em USF, nos quais todos os utentes têm o seu médico de família, excepto se por opção própria o não desejarem, a hipótese de encerramento do SAP ou similar, ou até a simples redução do horário de funcionamento, desencadeia de imediato uma tempestade de reclamações e protestos! Como se tal modelo de atendimento tivesse sido criado para outra coisa que não a da tentativa de dar resposta em clínica geral, avulsa e pontualmente, sem sequência, incoerente e sem continuidade.
A saída de profissionais médicos, designadamente da Medicina Geral e Familiar, resultou da conjugação de factores circunstanciais, embora expectáveis em função dos tempos.
O envelhecimento demográfico do país e das gerações mais antigas de médicos que verdadeiramente asseguraram ao país o serviço médico à periferia e por isso, em tempo, optaram livre e apaixonadamente por integrar a carreira médica de clínica geral e arrancar com os primeiros centros de saúde “a sério”, atingiram o limite de idade.
Outros, perto disso, optaram pelo pedido de antecipação da aposentação. Todos eles, como todos os portugueses, cansados de uma situação social, económica e financeira que conduziu o país e o seu povo a apertos de vária ordem.
Mesmo o recurso a soluções excepcionais no âmbito da Administração Pública, quanto à possibilidade de os médicos poderem prolongar a sua prestação no SNS para além do início da aposentação, tem tido alguma aderência por parte dos clínicos, mas provavelmente só a partir de agora – com condições mais atractivas e tempo parcial – poderemos perceber o impacto.
Tem sido recorrente um discurso catastrofista em relação ao SNS.
Não parece, ainda assim, que esse seja o cenário real ou sequer que seja o que a generalidade dos cidadãos vê.
A resposta pronta face ao surto de legionella, no final de 2014; o alargamento da isenção de taxas moderadoras a milhões de cidadãos e agora a todos os indivíduos em idade pediátrica (até aos 18 anos de idade); a resolução da questão em torno dos medicamentos inovadores para a hepatite C, ou para o tratamento da paramiloidose há algum tempo atrás, são alguns exemplos de como, ainda assim, o sistema está vivo e procura soluções.
Em todo o caso, como profissionais de saúde e cidadãos responsáveis, precisamos de estar particularmente atentos para não deixar escapar o momento em que se passa do fisiológico para o patológico… Mesmo que por vezes essa evolução seja muito insidiosa.
A atual pressão que se coloca nos Cuidados de Saúde Primários (CSP) em Portugal é um presente envenenado para os seus utentes e profissionais de saúde.