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Arnaut, António 2

O advogado e antigo governante António Arnaut afirmou este fim-de-semana que há “uma direita reaccionária” no poder em Portugal, “presidida por um neoliberal assanhado”, que não tem sensibilidade e está contra o Serviço Nacional de Saúde (SNS).

Há “gente de direita que defende o SNS, há uma direita social – não esquecer – que defende a doutrina social da Igreja [católica]”, ressalvou António Arnaut, que falava na sessão de encerramento da conferência "Defender o SNS. Promover a saúde", que decorreu em Coimbra, por iniciativa do PS.

Mas também há “uma direita reaccionária, que é a que está no poder, presidida por um neoliberal assanhado, que não tem sensibilidade social nenhuma” e não defende o SNS, sustentou o antigo dirigente socialista e fundador do SNS.

“O SNS tem resistido pela sua grande força na consciência popular”, sublinhou.

Em 2012, “só a ADSE [subsistema de saúde para funcionários e agentes da administração pública] pagou 500 milhões de euros” a prestadores de cuidados de saúde privados, afirmou António Arnaut, questionando se “esses serviços” entregues a privados não poderiam ter sido desempenhados pelo SNS.

“Nos últimos anos, o SNS perdeu quatro mil camas” e o sector privado “aumentou duas mil camas”, salientou o antigo ministro dos Assuntos Sociais, apontando estes dados como outro dos indicadores que revelam que o actual Governo está contra o SNS e a favorecer o sector privado, que nunca “esteve tão viçoso” como agora.

“Se não fosse a Constituição da Republica” a actual maioria “já tinha revogado o SNS”, afirmou.

O Estado social é a marca identitária do PS e o SNS é a sua “trave mestra”, conclui António Arnaut, depois de considerar que “sem o PS não teria havido SNS” e que a respectiva legislação (Lei nº 56/79, de 15 de Setembro) foi aprovada pela Assembleia da República, há 35 anos, com os votos contrários dos partidos que formam a coligação que actualmente está no poder.

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O Estado gasta indevidamente dinheiro com a comparticipação de medicamentos prescritos na sequência de acidentes e que deviam ser pagos pelas seguradoras, alertou uma jurista da área.

Ana Andrade, jurista há mais de 20 anos a trabalhar no sector da saúde, alerta para a despesa que o Estado tem vindo a pagar ao longo de anos com a comparticipação de medicamentos que devia ser suportada por terceiros, como as seguradoras, quando os medicamentos são prescritos na sequência de acidentes e são comprados pelos utentes na farmácia.

“A acção meritória do Ministério da Saúde na redução de custos, designadamente com medicamentos, não teve ainda em conta os encargos que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) vem pagando indevidamente relativos a medicamentos prescritos a doentes cujos problemas de saúde decorrem de acidentes da responsabilidade de terceiros”, defende a jurista, que é também directora de serviços no SNS.

A jurista foi pela primeira vez confrontada com esta situação durante um episódio de acidente que se passou com a sua filha enquanto praticava desporto num clube privado com seguro, e que motivou uma ida à urgência e consequente prescrição de medicamentos.

A despesa hospitalar foi suportada pela seguradora, como manda a lei, mas os medicamentos foram em parte pagos pelo SNS, uma vez que são comparticipados pelo Estado. Isto, mesmo apesar de a instituição a que pertencia o médico prescritor saber qual a seguradora e o número da apólice.

Este episódio levou-a a fazer uma investigação sobre o assunto, tendo concluído que esta é uma prática generalizada e nem os próprios médicos têm consciência da situação.

Aliás, a jurista vinca que em “nenhum diploma legal ou regulamentar, nem nenhum procedimento hospitalar,” se alertam os médicos para a necessidade de se escrever a receita com o nome do terceiro responsável.

A agência Lusa contactou a Ordem dos Médicos e a Ordem dos Médicos Dentistas que confirmaram esta situação.

Já a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) responde que o sistema de prescrição possibilita a identificação de uma entidade financeira responsável, mas quando questionada em pormenor, remeteu para os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde.

Segundo a ACSS, existe uma plataforma que permite facturar às seguradoras quando são estas as entidades financeira responsáveis pelos cuidados de saúde prestados ao utente. Quanto aos medicamentos, se a prescrição for associada à entidade financeira responsável, os medicamentos "não terão direito a comparticipação e serão pagos pelo utente".

Os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS) explicam também que “os medicamentos prescritos por médicos dos hospitais e aviados em farmácias normais comunitárias são pagos na totalidade pelo utente”.

“Para receber o reembolso, o utente deverá apresentar a factura à sua seguradora”, indica a SPMS.

A jurista Ana Andrade lembra, no entanto, que o terceiro responsável nem sempre é conhecido no momento do acidente e da prestação de cuidados e consequente prescrição de medicamentos.

Além disso, nas receitas usadas no SNS nunca figura o nome de outro terceiro responsável que não seja o próprio SNS ou subsistemas como a ADSE. Mesmo quando se conhece o terceiro responsável.

Aliás, várias farmácias contactadas pela Lusa confirmaram que nas receitas médicas aparece, na “entidade responsável”, sempre o SNS ou algum dos subsistemas de saúde e nunca o nome de uma seguradora.

“O SNS paga o que as seguradoras ou outros terceiros responsáveis deveriam pagar, sem possibilidade de retorno quando se conhecer o terceiro responsável”, refere a jurista, que já alertou o Ministério da Saúde diversas vezes para esta questão.

Contactada pela Lusa, a SPMS não esclareceu quantas receitas passadas em nome de seguradoras ou de terceiros responsáveis foram emitidas nos últimos anos.

A solução, defende a jurista, pode passar por duas vias, sendo uma delas a ligação do sistema informático da prescrição de medicamentos com o sistema informático dos hospitais para que nas receitas médicas apareça o nome do terceiro responsável quando ele já é conhecido.

Outra das soluções é a criação de uma “marca” em todas as receitas passadas a utentes que se saiba serem vítimas de acidentes, mas em que ainda se não conhece o responsável, para que, quando for conhecido, o SNS lhes possa facturar os valores que pagou.

Procedimentos idênticos poderiam ser também aplicados a consultas e meios auxiliares de diagnóstico e terapêutica prescritos após a entrada da vítima dum acidente nos serviços de urgência.

A jurista argumenta que muitas dessas consultas, análises, ou radiografias não ficam “ligadas” ao episódio clínico inicial, e, quando mais tarde se passa a conhecer o responsável pelo acidente, já não há possibilidade de aqueles custos serem então facturados a esses responsáveis.

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Arnaut, António 2

O histórico socialista António Arnaut defendeu hoje que o cenário macroeconómico do PS, divulgado esta semana, deve traduzir “a reabilitação do Estado Social” e do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

“Espero, sobretudo, que ao lado do rigor das contas seja reabilitado e consolidado o Estado Social, que está praticamente destruído, e o SNS que se encontra à beira do colapso”, declarou António Arnaut à agência Lusa.

Este fundador do PS e principal impulsionador do SNS disse que, após ter lido o documento “Uma década para Portugal”, apresentado na terça-feira, concluiu que se trata de “um bom ponto de partida” para uma nova governação de Portugal.

“E espero que o subsequente programa de Governo do PS seja um excelente ponto de chegada”, especialmente para a recuperação dos serviços públicos, como o SNS, que integram o Estado Social, acrescentou.

Para o antigo ministro dos Assuntos Sociais, “várias situações noticiadas, nos últimos tempos, são indicadoras das inqualificáveis malfeitorias que este Governo tem feito” ao Serviço Nacional de Saúde.

“Fala-se, actualmente, na falta de camas nos hospitais. Ainda recentemente, o IPO do Porto foi obrigado a cancelar, num só dia, 266 cirurgias por falta de camas para os doentes”, lamentou.

O cenário macroeconómico do PS assume como base central a projecção da Comissão Europeia sobre a evolução da economia portuguesa, até 2019, e como baliza o cumprimento por Portugal do pacto de estabilidade.

Intitulado “Uma década para Portugal”, este “estudo técnico” foi liderado por Mário Centeno, doutorado pela Universidade Harvard, nos Estados Unidos, e quadro superior do Banco de Portugal, e foi dividido em três partes: instrumentos de avaliação sobre o impacto das políticas públicas; diagnóstico sobre a situação da economia portuguesa; e conjunto de medidas adequadas face a esse diagnóstico.

Entre os princípios considerados nucleares no estudo, está a impossibilidade de Portugal violar os compromissos assumidos no âmbito da sua participação no euro.

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terça-feira, 21 abril 2015 13:32

Médicos trocam hospitais privados por unidades do SNS

Pesem as denúncias recorrentes de que nos últimos anos foram muitos os médicos dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde que transitaram para as unidades privadas, o que aconteceu foi precisamente o contrário. É pelo menos esta a informação disponibilizada pelo Instituto Nacional de Estatística, que assinalou o Dia Mundial da Saúde com a divulgação de um destaque com informação pormenorizada sobre a evolução do sector da Saúde entre 2002 e 2013. No período considerado, os hospitais privados perderam cerca de mil clínicos, contando hoje com 2.349 destes profissionais. Já os hospitais públicos viram os seus quadros reforçados com mais 1.822 profissionais, contando hoje com 19.531.

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quarta-feira, 08 abril 2015 15:00

UE elogia Portugal por mudanças na Saúde

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O Comité de Política Social da União Europeia (UE) elogiou as mudanças feitas em Portugal na saúde e nas pensões de reforma, mas contrapôs a necessidade de garantir uma adequada cobertura da assistência social.

A análise da aplicação das recomendações específicas do Conselho Europeu de 2014, no âmbito dos Programas Nacionais de Reforma, foi disponibilizada na noite de terça-feira pela Direcção-Geral da Saúde (DGS), no seu site.

Da reforma do sistema de saúde diz-se que “continua a produzir resultados”.

A DGS adiantou que a avaliação decorreu nos dias 24 a 26 de Março de 2015, na Comissão Europeia, em sede conjunta do Comité de Protecção Social e do Grupo de Alto Nível de Saúde Pública do Conselho Europeu.

No entendimento dos analistas da situação portuguesa – Dinamarca e Comissão Europeia –, as “mudanças no sector hospitalar” e a “optimização de custos” permitiram poupanças. As principais medidas apontadas foram progressos na reforma hospitalar, racionalização de custos operacionais, centralização de aquisições, a publicação de Normas de Orientação Clínica que incluem análise de custos, a aplicação de um sistema de avaliação de tecnologias da saúde, o combate à fraude, o aumento de adesão dos médicos e doentes aos medicamentos genéricos, com a DGS a especificar o acordo celebrado entre o Ministério da Saúde e a indústria farmacêutica para baixar o custo dos medicamentos.

No texto considerou-se também que a aplicação do programa de ajustamento trouxe “desafios crescente em termos de intervenção pública, em particular quanto ao alcance da protecção social e inclusão social”.

O documento realçou que uma “parte importante” de desempregados que não tem qualquer cobertura de apoio. Os analistas terminaram o seu texto com a recomendação de que Portugal “precisa de continuar a fazer esforços para garantir que as reformas estruturais conduzam a uma cobertura adequada da assistência social, incluindo o rendimento mínimo”.

António Arnaut apela a Cavaco para travar "colapso no Serviço Nacional de Saúde"

O ex-ministro António Arnaut apelou ao Presidente da República, Cavaco Silva, para intervir de modo a preservar o Serviço Nacional de Saúde (SNS), alertando que se vive uma “situação trágica”, muito perto “do colapso”.

“A situação em que vivemos é trágica, estamos a aproximar-nos do colapso do Serviço Nacional de Saúde”, disse o ex-governante socialista, que assumiu a pasta dos Assuntos Sociais no II Governo Constitucional, liderado por Mário Soares.

Para António Arnaut, as reformas da saúde em Portugal resultaram na expansão do sector privado, à custa da destruição do serviço público.

“Isto é uma questão política de primeira linha, porque tem a ver com a democracia portuguesa”, defendeu aquele que é classificado como o “pai” do SNS.

“Deixemos os estudos. Sou utente do SNS e conheço o que se passa aqui e noutros sítios. O grande problema é que há uma política premeditada, a nível europeu e também em Portugal, de destruir o Estado social e aquilo que pode ser objecto de negócio, de mercantilização, a saúde e a escola pública”, acusou.

O grande problema, prosseguiu, não será tanto o ministro da Saúde, Paulo Macedo, mas “o primeiro-ministro”, Pedro Passos Coelho, que classificou como “um neoliberal assanhado”.

António Arnaut recorreu a estudos já publicados para recordar que o sector público perdeu 3.000 camas nos últimos quatro anos, enquanto o privado ganhou 2.000, com novas unidades a abrir todos os dias.

“Isto é uma situação muito preocupante, porque sendo Portugal um país com dois milhões de pobres e outros dois milhões em risco de pobreza, com o desemprego que temos, se lhes falta o SNS que lhes presta assistência médica numa situação de aflição, então receio que haja realmente uma convulsão social”, declarou.

António Arnaut voltou a apelar ao Presidente da República para intervir: “isto é uma questão de dignidade nacional, de respeito pela Constituição da República”.

“Se o Presidente interveio quando era ministro da Saúde Correia de Campos e provocou a queda do ministro, estranho muito o seu silêncio, que é um silêncio cúmplice do actual governo”, sublinhou.

“Tem de chamar a atenção para a situação que se verifica na saúde, porque o colapso que se verificou nas urgências mostra como o SNS está completamente debilitado em recursos humanos e técnicos", exemplificou.

Portugal, afirmou, é dos países que “menos gasta em saúde” (cerca de 800 euros per capita).

“Os médicos e enfermeiros trabalham até à exaustão e, dentro dessa falta de recursos humanos, verificou-se a destruição de equipas médicas, sobretudo de urgência, que funcionavam exemplarmente”, apontou António Arnaut, para quem o Chefe de Estado não pode furtar-se a uma intervenção.

“A realidade é esta: muitas pessoas não vão às consultas ou às urgências porque não têm dinheiro para pagar as taxas moderadoras”, lamentou.

Para o ex-político, trata-se de “uma situação calamitosa” que põe em causa “a saúde dos portugueses, os princípios da igualdade, a coesão social e a paz social”, um bem público.

Movimento de Utentes da Saúde diz que a situação se agrava a cada dia

O Movimento de Utentes da Saúde defendeu hoje que a situação se agrava a cada dia para quem recorre ao serviço de cuidados públicos e considerou que relatórios feitos sem ouvir todas as partes resultam em “falta de realismo”.

Manuel Villas-Boas, do Movimento de Utentes, afirmou: “aquilo que verificamos em Portugal é que a situação se agrava, e é curioso porque ainda ontem (terça-feira) tivemos oportunidade, e hoje também, de assistir a protestos das populações porque umas não têm médico de família, outras tinham o centro de saúde a funcionar, mas deixou de funcionar por falta de médicos”.

“Dá ideia que as pessoas que fizeram esse relatório não andaram no terreno a ver aquilo que efectivamente se passa”, criticou o representante dos utentes.

“Pode vir o senhor ministro da Saúde dizer que está tudo bem, mas o que é certo é que ainda ontem se mostrou muito constrangido relativamente a uma estatística do INE que nos dizia que, em 10 anos, os serviços de urgência nos centros de saúde passaram de 276 para 94 unidades e portanto não percebo como é que um relatório de um organismo responsável da União Europeia pode passar por cima destas dificuldades todas sem uma palavra”, acrescentou.

Os utentes querem ser ouvidos quando estiverem em causa avaliações aos serviços públicos, contrapondo que se essa informação não for recolhida os relatórios não reflectem toda a realidade, mas apenas um lado, que “será o mais conveniente”.

“Não vamos à situação real do sistema de saúde em Portugal e aí é que deviam incidir os cuidados”, disse Manuel Villas-Boas.

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Tem-se verificado na área da Saúde uma persistente dissonância entre o discurso oficial e a realidade. Não faltam exemplos que atestem a afirmação. Desde logo, a restrição orçamental sustentada no controlo da despesa pública com medicamentos e na redução de salários, que não foi acompanhada de alterações estruturais… E os critérios nacionais de acesso à inovação terapêutica que tardam em ser definidos de forma clara.

Lacunas de uma governação que desistiu das reformas anunciadas, agravando o panorama nos cuidados de saúde primários e nos hospitais, e que desinvestiu nos recursos humanos fazendo diminuir a qualidade global das equipas e a respectiva estabilidade em termos de projectos profissionais. Ao mesmo tempo que agravou os pagamentos directos, por parte dos cidadãos, fazendo aumentar as desigualdades no acesso. A análise é de Adalberto Campos Fernandes. Em entrevista ao nosso jornal, o médico e gestor afirma que em certa medida tem prevalecido uma visão minimalista do SNS que, paradoxalmente, não ajudou a resolver praticamente nenhum dos seus problemas estruturais.

JORNAL MÉDICO |Referiu há dias que “o Governo tinha legitimidade eleitoral para aplicar um programa, por exemplo, de privatização, da substituição do sistema público pelo sistema privado, mas ficou a meio da ponte”… Qual a metade que cumpriu e a que ficou por ultrapassar?

ADALBERTO CAMPOS FERNANDES| A política de saúde foi subordinada, quase por inteiro, a uma leitura orçamental. É um facto que as obrigações internacionais, assumidas no memorando de entendimento de 2011, impunham metas difíceis no controlo da despesa pública em saúde. No entanto, o que verificámos foi a aplicação de cortes transversais, para além do fixado no memorando, e um reduzido empenho na concretização de reformas sectoriais com impacto estrutural no sector. A estagnação da reforma dos cuidados de saúde primários (CSP) e a ausência de uma eficaz reforma hospitalar são disso um claro exemplo. Em grande medida perdeu-se uma oportunidade de reformar o modelo de financiamento e de organização do sistema de saúde num contexto em que a generalidade dos intervenientes, no sector da saúde, manifestou um elevado espírito de cooperação. No balanço destes últimos quatro anos o que sobressai como mais evidente é a ausência de uma ideia política clara sobre o sistema de saúde e o papel do Serviço Nacional de Saúde (SNS) no seu contexto.

JM | Que modelo de sistema se adequaria melhor à realidade nacional?

ACF | Nos últimos trinta e cinco anos o modelo constitucionalmente definido provou ser capaz de responder às necessidades dos cidadãos. Quando analisamos a evolução do sistema de saúde português, neste período e, em particular o SNS, constatamos uma impressionante capacidade de adaptação aos diferentes contextos económicos, sociais e políticos que se traduziu, em grande parte, na melhoria global dos indicadores de saúde. Não vejo, por essa razão, nenhuma justificação do ponto de vista político, social e económico para substituir o actual modelo. Outra coisa será a necessidade de introduzir as adaptações necessárias à transição social, económica e epidemiológica que o país vive através da concretização das medidas de reforma que melhor adequem as respostas às necessidades em saúde dos cidadãos.

JM | E de financiamento…

ACF | O modelo de financiamento deverá manter a sua base de contribuição fiscal na medida em que desta forma se garante uma maior equidade contributiva e um melhor equilíbrio nos princípios da cobertura geral e da universalidade. Num país onde persistem importantes desigualdades no rendimento cumpre ao Estado assegurar a mutualização do risco e salvaguardar a equidade no acesso a cuidados de saúde de qualidade. Tal não invalida a necessidade de tornar mais eficiente a relação entre financiamento e implementação das políticas de saúde, nomeadamente, através de um maior grau de eficácia na definição de prioridades bem como nos modelos de contratualização utilizados nos diferentes níveis e com as entidades prestadoras de cuidados. O financiamento terá de ser entendido como um instrumento de indução de eficiência e da equidade incorporando, cada vez mais, uma componente orientada para resultados que possa favorecer uma trajectória de sustentabilidade a longo prazo da despesa pública em saúde.

JM | Apontando os resultados do Relatório sobre o Envelhecimento de 2012, a Comissão Europeia (CE) afirma que o sistema de saúde português enfrenta um desafio de sustentabilidade fiscal, com as projecções da evolução da despesa a crescerem muito acima do valor médio esperado para a União Europeia (UE). É comportável?

ACF | Portugal confronta-se com um problema demográfico muito sério. A redução da natalidade conjugada com o fenómeno recente da emigração de população muito jovem veio agravar ainda mais a tendência de envelhecimento da população que já se vinha a desenhar há muito tempo. Não parece fácil a inversão desta tendência. Acresce o facto de o envelhecimento em Portugal fazer coincidir nos últimos anos de vida uma morbilidade mais complexa e mais impactante na qualidade de vida. Este facto é particularmente relevante quando nos comparamos com outros países com longevidade semelhante no que diz respeito à esperança média de vida. Este contexto social e demográfico faz antever sérios riscos orçamentais para os próximos anos tendo em vista a estabilidade do conjunto das políticas sociais. As opções são limitadas dependendo, sobretudo, da qualidade das escolhas sociais e políticas, em termos de prioridades, bem como da capacidade do país em criar valor através do crescimento da economia e do emprego.

JM | É viável suprir as necessidades de financiamento futuras através do aumento da comparticipação privada na despesa com saúde?

ACF | Não me parece que seja suportável num país com as nossas características sociais e demográficas sem que a tal corresponda um sério agravamento das desigualdades no acesso aos cuidados de saúde. Além disso uma repartição tão desequilibrada nas componentes da despesa induz uma desagregação do sistema de saúde e uma consequente dificuldade na implementação de políticas integradas de saúde.

A restrição imposta ao SNS, nos últimos anos, empurrou muitas pessoas para fora do seu perímetro de utilização não porque o desejassem mas porque as condições de acesso se foram tornando cada vez mais difíceis. Este facto contribuiu igualmente para a desnatação de profissionais do SNS e para um esforço financeiro acrescido por parte dos cidadãos e das famílias.

JM | Uma das medidas, mais vezes apontada como “certeira” nos relatórios internacionais de avaliação das reformas estruturais do sistema de saúde, é a da reorganização hospitalar… Que avança devagarinho, o mais das vezes à “socapa”…

ACF | É verdade que em múltiplos relatórios nacionais e internacionais a reforma hospitalar aparece quase sempre referida como o “alfa e o ómega” da sustentabilidade do sistema de saúde. Também não deixa de ser curiosa a dificuldade repetida, nos diferentes ciclos políticos, em a levar à prática. Creio que nesta dificuldade se misturam diferentes factores. Por um lado a questão do tempo e da oportunidade. Uma reforma dos hospitais é necessariamente matéria a tratar no início de uma legislatura. Tal pressupõe que o “trabalho de casa” deverá estar feito antes. Neste último ciclo político verificámos que a recomendação constante no memorando de entendimento de 2011 não teve aplicação atempada por aparente falta de preparação do processo. Daí a sucessão de estudos e de grupos de trabalho que atrasaram uma qualquer decisão acabando por determinar o seu congelamento. Em qualquer caso trata-se de uma reforma complexa e demorada que deve, obrigatoriamente, compatibilizar rigor técnico com adequação social e territorial.

JM | Como justifica a existência da portaria n.º 82/2014 de 10 de Abril? Foi uma tentativa de passar “entre as gotas da chuva”, ou teve outro objectivo?

ACF | Confesso alguma dificuldade em perceber o objectivo. Aparentemente tratou-se de uma medida legislativa pontual para enquadrar algumas situações decorrentes de falta de recursos e menos de um instrumento estratégico de governação.

JM | No actual panorama político português é possível cumprir uma mudança tão radical?

ACF | A concretização deste tipo de mudanças requer diálogo com os diferentes actores políticos, sociais e profissionais. No entanto, o aspecto mais importante reside na qualidade técnica das propostas e das alternativas apresentadas. Os representantes locais e as populações reagem muitas vezes pelo receio de perder algo garantido em troca de alguma incerteza. Nessa medida é preciso garantir a cooperação de todos os intervenientes através da demonstração do valor das transformações bem como das medidas de recomposição da oferta de cuidados. Intervir no perfil assistencial de um hospital, por si só, não fará nenhum sentido se em cima da mesa não estiverem bem evidenciadas as regras de referenciação, o reforço dos cuidados de saúde primários e continuados, a rede de transportes entre muitos outros aspectos que configuram o mosaico global da oferta de cuidados.

JM | Quando referiu “tiveram medo de atacar o SNS, bateram com a mão no peito a defendê-lo, mas foram, por omissão, provocando danos que são irreparáveis”, a que danos se referia exactamente?

ACF | Parece ter existido uma persistente dissonância entre o discurso oficial e a realidade. São múltiplos os exemplos. A restrição orçamental sustentada no controlo da despesa pública com medicamentos e na redução de salários não foi acompanhada de alterações estruturais. Os critérios nacionais de acesso à inovação terapêutica tardam em ser definidos de forma clara. O desinvestimento nos recursos humanos fez diminuir a qualidade global das equipas e a respectiva estabilidade em termos de projectos profissionais. O agravamento dos pagamentos directos, por parte dos cidadãos, fez aumentar as desigualdades no acesso. A desistência das reformas agravou o panorama nos cuidados de saúde primários e nos hospitais. Em certa medida prevaleceu uma visão minimalista do SNS que, paradoxalmente, não ajudou a resolver praticamente nenhum dos seus problemas estruturais.

JM | “O SNS não morreu, nem vai morrer”, ouve-se insistentemente. Acredita?

ACF | O SNS representa um dos pilares de sustentação da democracia fundado num poderoso quadro de valores políticos e sociais. Os portugueses convergem num sentimento de grande unanimidade sobre a importância do SNS perdurar como um eixo estruturante da protecção na saúde e do desenvolvimento humano. Nessa medida, acredito que o SNS resistirá a este ciclo de grandes dificuldades conservando o seu potencial endógeno de recuperação e de desenvolvimento.

JM | Qual o rumo que deve ser seguido?

ACF | Será possível reencontrar um caminho para o desenvolvimento do SNS num contexto global de eficiência e de equidade no acesso a cuidados de saúde de qualidade. É fundamental gerar consensos em torno de uma estratégia que encontre na qualidade dos cuidados e na transparência dos processos os ingredientes fundamentais para a sustentabilidade duradoura a médio e longo prazo. Para tal será importante reconhecer nos profissionais um importante papel enquanto aliados e não como adversários deste caminho. No fundo, procurar uma vasta aliança estratégica para o desenvolvimento do SNS e para a melhoria global da saúde com todos os que são parte interessada no seu sucesso.

JM | Nos últimos dias o caos nas urgências e as demissões que o acompanham têm sido um dos principais “ganha-pão” dos jornalistas. Como avalia a situação?

ACF | Trata-se de um sinal muito negativo da fragilidade das instituições que integram o SNS. Por vezes parece transformar-se na única forma de forçar cedências perante necessidades críticas. Revela igualmente uma diminuição da capacidade de gestão dos órgãos de administração e de problemas ao nível da monitorização do funcionamento do sistema por parte das administrações regionais e central da saúde.

JM | No último balanço social do SNS, de 2013, constata-se que 78% dos recursos humanos estão nos hospitais contra apenas 22% nos CSP. Faz sentido?

ACF | Este é verdadeiramente o “calcanhar de Aquiles” do sistema de saúde português. Uma excessiva concentração de recursos nos hospitais agravada pela deficiente articulação interinstitucional e incipiente partilha de recursos. A reorientação do sistema de saúde português passa pelo reforço dos cuidados de proximidade e pelo investimento em estruturas e recursos humanos que possam transferir a centralidade do sistema para fora do hospital. Neste sentido é fundamental resolver as “hesitações” políticas quanto aos modelos de organização dos CSP tornando estes fortemente atractivos do ponto de vista profissional e reforçando a qualidade da percepção dos cidadãos face à respectiva importância no contexto do sistema de saúde.

JM | É possível e desejável alterar – em tempo útil – este cenário?

ACF | Parece possível que assim seja. Aliás não haverá trajectória credível de sustentabilidade para o SNS que não passe pelo reforço deste pilar de cuidados e pela simultânea requalificação e racionalização da rede hospitalar através de um processo de reordenamento e de concentração de competências.

JM | Há défice de cuidados hospitalares porque há falta de recursos e profissionais ou por má organização? Ou por tudo junto?

ACF | Tem sido recorrente o argumento da falta de profissionais, nomeadamente, médicos. Creio que estamos perante uma apreciação deturpada da realidade do sistema de saúde. Em abstracto, na comparação internacional, Portugal tem um ratio de médicos por 100.000 habitantes que se encontra acima da média dos países da OCDE. Tal não significa que nalgumas especialidades, por razões específicas de demografia médica, não possam ser identificadas algumas dificuldades. Outra coisa é ignorar o impacto da desorganização dos cuidados e dos modelos de gestão de recursos no desempenho global do sistema. Nessa matéria temos muitas deficiências que acabam por gerar ineficiência na resposta dando a percepção pública errada da falta de recursos. A falta de clareza na abordagem das dificuldades gera confusão e não é útil no desenho das soluções. Tal como como não se deve confundir ineficiência e desperdício com subfinanciamento, também me parece errado confundir falta de recursos com desorganização e ausência de planeamento estratégico.

JM | A sigla EBITDA entrou no vocabulário indígena. Tendo em conta o modelo de financiamento (com todas as suas vicissitudes, desde logo a do subfinanciamento crónico)… É “sigla que se tenha” no SNS que temos?

ACF | Ninguém põe em dúvida a necessidade de equilíbrio orçamental e do consequente rigor na gestão. Num país com recursos escassos os deveres de transparência e de qualidade na gestão tornam-se ainda mais pertinentes. Outra coisa bem diferente é aplicar metodologias de controlo de gestão e de avaliação de desempenho, de natureza empresarial, a instituições a quem foram retiradas a grande maioria dos instrumentos de gestão e de autonomia. Trata-se de mais um dos paradoxos de difícil compreensão.

JM | A meio da ponte também ficou a reforma dos CSP. Temos metade do país em USF e a outra em unidades sem um modelo homogéneo, genericamente designadas de UCSP. Das candidaturas entradas em 2014 só uma avançou… Como “lê” esta realidade?

ACF | Parece um sinal claro da falta de vontade em considerar os CSP um instrumento estratégico de transformação do sistema de saúde. A estagnação verificada aliada à vontade de desconstruir o modelo ensaiado na reforma iniciada em 2007 explicam a realidade actual a nível nacional. Sem vontade política não será possível avançar para um quadro de homogeneização estrutural e funcional capaz de assegurar em todo o território uma equivalente garantia nas condições de acesso aos CSP.

JM | Que funções e em que contexto se podem "descentralizar" serviços de saúde… Entregando-os às autarquias locais?

ACF | Não está claro se estamos perante uma transferência ou uma delegação de competências. Aparentemente não terá havido consenso bastante entre a administração central e a administração local. Tenho muitas reservas quanto à transferência de competências em matéria de política de saúde global. Tal não diminui, contudo, a utilidade de se estabelecerem parcerias locais em áreas tão distintas como a promoção e a educação para a saúde, os cuidados de proximidade e o apoio directo às populações, a mobilidade dos doentes, a continuidade de cuidados e ainda a síntese entre as intervenções específicas em saúde e a acção social e comunitária.

Médico, gestor… Ministeriável

Na última década tem surgido invariavelmente na lista de ministeriáveis, sempre que na Av. João Crisóstomo há mudança de inquilino. Independentemente da cor dominante no novo ciclo político… Médico especialista em Saúde Pública, gestor hospitalar e docente universitário, Adalberto Campos Fernandes preside actualmente à Comissão Executiva do SAMS Prestação Integrada de Cuidados de Saúde. Foi presidente do Conselho de Administração da HPP Parcerias Saúde, SA, Hospital de Cascais; cargo que também desempenhou no Hospital de Santa Maria e no Hospital Pulido Valente, unidades que integram o Centro Hospitalar Lisboa Norte. Professor Auxiliar Convidado da Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa nas áreas de Administração Hospitalar, Gestão em Saúde e Políticas de Saúde, é membro da Direcção do Colégio da Competência de Gestão dos Serviços de Saúde da Ordem dos Médicos. Integra ainda a direcção do INODES - Associação de Inovação e Desenvolvimento em Saúde.

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A Comissão Europeia (CE) iniciou uma acção por incumprimento contra o Estado Português pela não transposição, na sua totalidade, da directiva comunitária relativa aos pagamentos em atraso. Em causa, a exclusão do sector público da saúde das obrigações previstas na norma comunitária.

De acordo com a CE, a situação tem conduzido ao agravamento da liquidez das empresas, pressionadas pela extensão excessiva dos prazos de pagamento a fornecedores pelo sector público. A decisão de Bruxelas de avançar com uma acção por incumprimento contra Portugal é reforçada pelo facto de não ter havido por parte do executivo de Pedro Passos Coelho, a adopção de quaisquer medidas correctivas ou assumidos compromissos visando a resolução do problema, sublinha a CE.

A informação consta de um relatório sobre Portugal elaborado pela CE e distribuído no passado dia 26, onde os técnicos de Bruxelas tecem duras críticas à actual situação portuguesa em múltiplos sectores.

No relatório, a CE afirma ainda que no que toca a investimento, Portugal regrediu em quase todas as áreas, do investimento público na saúde, ao envolvimento do Estado em parcerias com o sector privado em projectos de investigação visando a transferência e comercialização de conhecimento.

Saúde: o desafio da sustentabilidade

Apontando os resultados do Relatório sobre o Envelhecimento de 2012, os técnicos da CE não hesitem em afirmar que o sistema de saúde português enfrenta um desafio de sustentabilidade fiscal, com as projecções da evolução da despesa em saúde a revelarem um crescimento muito acima do valor médio esperado para a União Europeia (UE).

Uma situação particularmente grave se se atender ao facto de Portugal apresentar um dos valores mais baixos da UE no que toca à comparticipação pública nos gastos totais com a saúde (63%, face aos 73% da média da União).

Segundo as contas da CE, a contribuição privada para a despesa total com a saúde cresceu 4,5% entre 2007 e 2012, no que constitui o maior aumento registado na Europa a 28.

Mas não se ficam por aqui os problemas apontados ao Serviço Nacional de Saúde (SNS). De acordo com o relatório a que o nosso jornal teve acesso, 14% da população não tem médico de família atribuído e os tempos de espera para algumas cirurgias programadas aumentaram entre 2010 e 2013, no que segundo os técnicos da CE constitui um retrocesso face à tendência anterior e que vem confirmar o aumento crescente de necessidades de saúde não satisfeitas. “Esta situação sugere ser necessário desenvolver esforços no sentido de manter os actuais níveis de acessibilidade”, apontam os técnicos da CE.

Reformas devem ser cumpridas

Pesem as muitas críticas, os relatores do relatório sobre Portugal reconhecem que as reformas em curso no SNS têm permitido alguns progressos. “As reformas do sector hospitalar e de optimização dos custos contribuíram, nos anos mais recentes, para poupanças no sector da saúde”, aponta o documento. Ainda assim, alertam os técnicos, as dívidas do sector hospitalar mantém-se como um desafio a enfrentar, não obstante ter-se vindo a registar uma redução significativa e sustentada desde 2012”.

De entre as medidas implementadas no âmbito das reformas em curso destacados no relatório como positivas, os técnicos da CE apontam a criação de centros de referenciação, a decisão de reclassificar os hospitais do SNS em função das valências disponibilizadas e população abrangida e ainda os procedimentos centralizados de aquisição, “que continuam a permitir poupança de recursos”. Uma situação que se repete com o crescimento do mercado de medicamentos genéricos comparticipados e com a negociação de preços de novos medicamentos com a indústria farmacêutica.

Outra reforma promissora é a da introdução da figura do enfermeiro de família, com novas competências, que permitirão, assegura a CE, ganhos ao nível da prevenção e promoção da saúde ao nível dos cuidados de saúde primários.

Finalmente, os técnicos da CE destacam os esforços do executivo para aumentar o número de profissionais em regiões carenciadas através da introdução de incentivos.

Hospitais EPE melhoram performance

De acordo com o relatório dos técnicos da CE, a que o nosso jornal teve acesso, graças à reestruturação das operações das instituições do sector público empresarial (EPE), o desempenho operacional das empresas manteve uma trajectória positiva em 2014. Foram disponibilizados 309 milhões de euros com o objectivo de impedir novo acumular de dívida em atraso nos hospitais EPE, melhorar o balanço operacional e permitir o fornecimento de serviços de saúde adicionais realça o relatório da CE. No final de 2015, será possível, de acordo com os dados da CE, o sector público empresarial da saúde alcançar o equilíbrio financeiro.

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Arnaut, António 2

O fundador do Serviço Nacional de Saúde (SNS), António Arnaut, disse hoje que a saúde em Portugal “está à beira do colapso” e justifica uma intervenção do Presidente da República junto do Governo.

“O seu dever é alertar o Governo para que não faça mais malfeitorias ao Serviço Nacional de Saúde”, disse António Arnaut à agência Lusa, apelando ao Chefe de Estado, Aníbal Cavaco Silva, para que “tome uma posição pública e advirta o Governo de que com a saúde não se brinca”.

O antigo ministro dos Assuntos Sociais lamentou “os acontecimentos no sector da saúde nos últimos tempos, com sucessivas demissões, mortes evitáveis nas urgências e esperas de 20 horas”, situações “mais próprias de um país do terceiro mundo” que causam “muita preocupação a todos aqueles que se interessam pelo bem-estar e a dignidade” dos portugueses.

“Porque estão a ser perdidas vidas, estão a ser feitos atentados à dignidade dos cidadãos e estamos numa situação que envergonha o país, é altura de o senhor Presidente da República, que é o garante do regular funcionamento das instituições democráticas, ter uma palavra cumprindo o seu dever”, acentuou.

Essa intervenção pública de Cavaco Silva deve levar o executivo de Pedro Passos Coelho “a tomar algumas medidas necessárias em tempo, dando, por exemplo, aos conselhos administrativos das unidades do SNS autonomia” para contratar pessoal.

“Há equipas médicas que foram desfeitas, há serviços de urgência que têm menos de metade do pessoal e, portanto, estamos a entrar num colapso verdadeiramente”, alertou António Arnaut.

O SNS “está ligado à máquina com respiração assistida, mas o pior é que há pessoas que o querem desligar da máquina e provocar a sua morte”, disse, responsabilizando também o sector privado da saúde.

“Ainda recentemente o presidente da Associação Portuguesa de Hospitalização Privada (Artur Osório) veio ufanar-se de que há uma grande expansão no sector privado graças às reformas feitas no SNS”, afirmou.

Para o fundador do SNS, “a famigerada lei dos compromissos, os cortes sucessivos no orçamento, as restrições impostas e a taxas moderadoras altas tornaram, muitas vezes, o SNS incapaz de responder às necessidades” dos portugueses.

“O espectáculo degradante de dezenas ou centenas de macas alinhadas pelos corredores e a transbordarem para o exterior dos hospitais é uma vergonha nacional”, criticou.

António Arnaut, um dos fundadores do PS, salientou ainda que, “se a ideia é destruir o SNS, a direita está à beira de o conseguir” e apelou ao Presidente da República para “vir a público dizer que com a saúde não se brinca”.

Em 2008, na mensagem de Ano Novo, Cavaco Silva “tomou uma posição pública e oportuna por alguns problemas muito menos graves que existiam no sector”, a que se seguiu a demissão do então ministro da Saúde Correia de Campos e sua substituição por Ana Jorge, no primeiro Governo de José Sócrates, recordou.

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O (Des)alento da Medicina Geral e Familiar no Serviço Nacional de Saúde
Editorial | Joana Torres
O (Des)alento da Medicina Geral e Familiar no Serviço Nacional de Saúde

A atual pressão que se coloca nos Cuidados de Saúde Primários (CSP) em Portugal é um presente envenenado para os seus utentes e profissionais de saúde.