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Cláudia Marques | claudiamarques@jornalmedico.pt ENTREVISTA | Jornal Médico
Estamos num
momento de
subfinanciamento
que começa a
ser arrastado no
tempo e que tem
necessariamente
consequências…
Sem melhorarmos
o financiamento
na saúde é
extraordinariamente
difícil levar a cabo
reformas essenciais
dos subsistemas – e existe um número muito que tinha dos medicamentos mais caros até costumo usar a título de exemplo de
elevado de portugueses com seguro de saú- da Europa para o que tem dos medicamen- como uma especialidade deve evoluir –, mas
de – este valor andará perto dos 40%, o que tos mais baratos. Isto teve, obviamente, re- entretanto a reforma estagnou…
quer dizer que o SNS é neste momento ape- percussões negativas nas farmácias, com A segunda é a reforma hospitalar, nomeada-
nas responsável por pouco mais de 60% da muitas a abrirem falência… Mas foi uma mente na sua face mais visível: o serviço de
despesa total em saúde. reforma que funcionou, em termos daqui- urgência. O país habituou-se a que a urgên-
Nos últimos anos, o SNS tem vindo a perder o lo que é o custo dos medicamentos para cia seja um serviço de fácil acesso e esta é
grau de universalidade que tinha e a equida- os doentes (não estamos aqui a falar de uma questão de hábitos.
de dentro do SNS neste momento não existe. terapêutica inovadora). A segunda medida
A única coisa que se mantém da matriz origi- foi a diminuição do Orçamento de Estado JM | E como se resolve esta questão do
nal que carateriza o nosso SNS é o contributo (OE) para a Saúde. O Dr. Paulo Macedo dei- acesso ao Serviço de Urgência, sendo ela,
através dos impostos. Os outros dois princí- xou este orçamento perto dos 6% do Pro- essencialmente, uma questão cultural?
pios estão claramente ameaçados. duto Interno Bruto (PIB) e o atual ministro MG | Toda a gente sabe o que é preciso fazer
manteve estes valores. para reformar o serviço de Urgência. É pre-
JM | As sucessivas reformas têm sido ciso melhorar os CSP, é preciso que por agru-
então, a seu ver, mais paliativas do que JM | Estamos, então, perante um subfi- pamento de centros de saúde (ACES) um ou
curativas? nanciamento do SNS… outro centro de saúde esteja aberto até mais
MG | As reformas, na minha opinião, pura MG | Estamos num momento de subfinan- tarde... É preciso que os médicos de família
e simplesmente não têm sido… Considero ciamento que começa a ser arrastado no (MF) tenham acesso direto a alguns exames
que houve duas políticas – que podem ser tempo e que tem necessariamente conse- de diagnóstico simples, de forma a poderem
consideradas reformas – que tiveram e quências… Sem melhorarmos o financia- dar uma resposta.
continuam a ter impacto no setor. A pri- mento na saúde é extraordinariamente difí- Tratado o aspeto organizacional, é essencial
meira prende-se com o preço dos medi- cil levar a cabo reformas essenciais. fazer uma grande campanha de educação
camentos, iniciada com o ministro Paulo A primeira é a dos cuidados de saúde primá- em saúde, informando massivamente e de
Macedo e a que o atual ministro está a dar rios (CSP), que teve um bom arranque com forma simples e objetiva o conceito de doen-
continuidade. O Dr. Paulo Macedo conse- as unidades de saúde familiar… Os CSP ti- ça aguda não urgente e onde devem as pes-
guiu reduzir o preço dos medicamentos veram uma ascensão enorme, tivemos uma soas dirigir-se nesses casos.
a valores inimagináveis até há uns anos. Medicina Geral e Familiar (MGF) com uma Depois, há que reformar o serviço de urgên-
De tal forma que Portugal passou de país evolução espantosa nos últimos anos – que cia consoante a sua tipologia e rever todo
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Abril 2017