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Jornal Médico   |  ENTREVISTA



         o modelo a  nível nacional, inclusivamente
         discutir se deve ou não ser criada a espe-
         cialidade de Medicina de Urgência, como já
         existe em outros países.

         JM | Esse é todo um trabalho que está por
         fazer por falta de dinheiro…
         MG|  As  reformas não estão concretizadas
         devido ao subfinanciamento. Porque os de-
         cisores  não pensam a médio/longo  prazo,
         apenas se preocupam com o curto prazo, o
         imediato… Porque mantendo-se o serviço de
         se urgência como está, consegue-se, apesar
         de tudo, prestar um serviço de qualidade a
         um custo muito mais baixo.
         Adicionalmente, não conseguimos também
         fazer uma coisa que é dramática para o nos-
         so  país  que  é  fixar  os  jovens  médicos  em
         Portugal e no SNS.

         JM | Quais as consequências para o país da
         crescente emigração de jovens médicos?
         MG | Há aqui dois fenómenos. Por um lado,
         há um grande número de jovens médicos
         a abandonar o serviço  público para traba-
         lhar exclusivamente no privado. Por outro,
         um número substancial de jovens médicos
         está a emigrar (são mais de três mil, nos últi-
         mos quatro anos). Estamos a falar de jovens
         médicos,  o  que  compromete a  capacidade
         da  inovação. Isto porque  a nova Medicina
         comporta um conjunto de desafios para os
         quais  o saber dos jovens médicos é essen-
         cial. Há cada vez mais tecnologias digitais e
         os jovens têm aqui um papel fundamental
         para ajudar a sociedade médica portuguesa
         a acompanhar esta revolução tecnológica.
         Há também cada vez mais jovens que optam
         por trabalhar exclusivamente no setor pri-
         vado e, como tal, estamos a ficar desnatados
         dentro do SNS. Isto significa também que as                                     os nossos melhores valores e… a custo zero.
         zonas mais deficitárias e mais carenciadas                                      Formar um médico acarreta custos relativa-
         do país estão cada vez pior, uma vez que os                                     mente elevados. Só durante a formação pré-
         médicos que optam pelo SNS, preferem  as                                        graduada, esse investimento custa por estu-
         grandes cidades à periferia.                                                    dante, ao erário público, entre 60 e 100 mil
         Outra consequência é o envelhecimento cada                                      euros, a que acrescem os custos durante o
         vez mais elevado da população médica. Nes-  Portugal não                        internato do ano comum e da especialidade.
         te momento, a idade média dos médicos no   precisa de novos
         SNS é superior à idade média da população                                       JM | Posto isso… Portugal tem médicos a
         em  geral,  o  que  coloca  problemas  comple- cursos de Medicina.              mais ou a menos?
         xos… Os quadros estão a envelhecer e a ca-  Estamos no limite                   MG | Nós formamos médicos a mais. For-
         pacidade de renovação dos mesmos está-se a   da nossa capacidade                mamos mais médicos do que aqueles de
         perder. Ou tomamos medidas urgentes para                                        que necessitamos. O que acontece é que es-
         fixar os jovens médicos em Portugal e prefe-  formativa. Neste                  tamos a perdê-los. A solução não é formar
         rencialmente no SNS ou, se não o fizermos,   momento o                          mais médicos, mas sim cativá-los para que
         poderá ser muito tarde e poderemos vir a ter                                    fiquem a trabalhar em Portugal e no SNS.
         um grande gap geracional – que o ministro  mercado – público                    Os países com reconhecida capacidade eco-
         da Saúde já reconheceu existir – que pode vir   e privado – para                nómica,  como  a  Alemanha,  não  formam
         a causar problemas muito complicados den-                                       muitos  médicos, eu  diria  que  até  formam
         tro de quatro a cinco anos. Esta é uma ver- formar estudantes                   menos  do que são as suas necessidades e
         dadeira situação de emergência para o país.  de Medicina, em                    depois  vão buscar  médicos  estrangeiros.
                                                 termos de unidades                      Isto  porque  não  querem  ter  que  se  ver  a
         JM | E como se retêm estes jovens médi-                                         braços com médicos sem especialidade.
         cos em Portugal e no SNS?               de saúde, está                          Para se ser médico e exercer Medicina com
         MG |  Com  a  melhoria  das  condições de   completamente                       qualidade tem que se ser especialista. Neste
         trabalho. Ou se melhoram as condições de                                        momento, Portugal está a criar um grupo
         trabalho ou vamos perdendo aquilo que são  saturado                             de médicos que não está a ter acesso à espe-


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